Tive que viajar a Benguela. Possivelmente herança do longo e recente período de guerras encerrado há menos de uma década, a burocracia nos aeroportos é maior que aquela à qual estava habituado. Logo à entrada há um funcionário que dá (ou não) acesso ao salão. Em frente ao balcão de check in outra pessoa que confere minha passagem, dá uma carimbada e me encaminha para o check in a (distantes) dois metros, imediatamente atrás do primeiro balcão. Passaporte e bagagens verificados, é a vez dos funcionários encarregados de passar os volumes no aparelho de raio x. Depois, outro balcão, de emigração, onde minha passagem e documentos são novamente verificados. Mais uma checada antes de ser autorizado a embarcar na aeronave. E é um voo doméstico! Tive sorte e desta vez o atraso foi de apenas quarenta minutos, na ida e uma hora e dez na volta. Tão pequenos que ninguém sequer pareceu reparar, muito menos se dar ao trabalho de reclamar. Ao desembarcar do avião, um susto. Perguntei onde estava e responderam: Catumbela. Tomei o avião errado, pensei, já que devia desembarcar em Benguela. Calma, explicaram, o aeroporto de Benguela está em obras e saltamos neste distante 15 minutos da cidade. Nas pistas MIGS protegidos por capas nos bicos das aeronaves lembravam mais uma vez o passado bélico a que me referi e que tantas dores causou a este povo sorridente. Benguela é uma cidade extremamente agradável, limpa, de ruas largas, litorânea, pouco movimentada, casas estilo colonial, geralmente bem cuidadas. Em nada lembra o caos de pessoas, carros, ruídos e odores de Luanda. À tarde, apesar de a temperatura em nada lembrar o estereótipo de calor africano, algo em volta de uns 22º, frio, portanto, crianças em roupas de baixo brincavam nas areias da praia, estudantes passeavam de mãos dadas em frente à casa do governador, um time de futebol feminino fazia ginástica num terreno de barro ao lado de uma escola. Nesta mesma jornada fui até Lobito, um dos maiores, talvez o maior porto de Angola. Cidade um pouco menos bem cuidada que Benguela, mas também muito bonita, com prédios coloniais lindíssimos e uma característica bem peculiar. Um braço de terra de uns duzentos metros de largura, em média, invade o mar por alguns quilómetros e cria um quebra-mar natural. Do lado externo, mar aberto, do lado da costa, um trecho de uns trezentos a quatrocentos metros de canal, entrada para o porto que fica na parte mais interna e protegida. Sobre esta faixa de terra, belos hotéis, restaurantes, residências. Entre Benguela e Lobito traços da cultura local, como casas feitas da mesma argila do chão, sem pintura, tornando meio indistintas as fronteiras entre onde termina o chão e começam as paredes. Ideogramas chineses, cada vez mais frequentes em Angola, registram a presença daquele país na reconstrução daquela que foi uma das mais importantes vias da África e seguramente a mais importante deste país – a ferrovia que ligava o Atlântico, a partir de Lobito, ao Oceano Índico, do lado oposto do continente africano. O trecho local tem reinauguração prevista o próximo ano. Em alguns trechos ao longo dos “caminhos de ferro” como é chamada a ferrovia aqui, muitas centenas de pessoas em feiras livres nas quais se vende de comida a peças de automóveis passando por vestuário. Um engarrafamento incomum para o horário –umas três e meia da tarde-, revela outra peculiaridade. Um grande comboio ocupando centenas de metros da rodovia, com muitas candongas, motos, carros particulares, caminhões, a maioria dos quais com o pisca-alerta ligado, ainda que seja dia, seguem um carro fúnebre em direção ao cemitério local, que fica ao lado da estrada. Uma última esticada para conhecer a Baía Azul, zona de veraneio contígua a Benguela, belíssima, mas totalmente diferente das praias do Brasil. Aqui a areia parece misturada com a argila e não tem a brancura a que nos acostumamos. É diferente, mas não menos bonito. O céu, totalmente encoberto já há mais de um mês (o famoso cacimbo) faz com que o sol mais se pareça com uma lua e possa ser olhado diretamente sem proteção para os olhos, e sem machucar a vista. Para concluir, no retorno à cidade, um bando de babuínos, com uns cinquenta ou mais indivíduos, se desloca do lado esquerdo da pista, depois muitos deles cruzam a estrada uns trinta metros à nossa frente, alguns com os filhotes agarrados nas costas. Abaixo, fotos de alguns destes registros. Na seqüência: 1) As construções que parecem emergir do chão de argila; 2)Belíssima ponte, réplica de uma que existe em Portugal,entre Benguela e Lobito; 3)Foto do porto, tirada do quebra-mar natural; 4)Carro funerário improvisado e parte do seu cortejo; 5)A Baía Azul e sua aparência real nesta época do ano, sob o manto do cacimbo; e 6) Babuíno atravessando a estrada.
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